Manual para não se afogar

Hoje, dia 22 de dezembro, completo 30 anos. No imaginário social, essa é a idade da "chegada". O marco onde o roteiro da vida adulta deveria estar com todos os capítulos devidamente preenchidos: estabilidade financeira, conquistas materiais e uma performance impecável. Mas, ao olhar para essa linha de chegada imaginária, percebo que o discurso da "superação constante" é, na verdade, um peso que nos puxa para o fundo. Aprendi que, nas águas turvas e profundas da vida, o maior desafio não é nadar contra a correnteza mais rápido que os outros; é, simplesmente, não desistir de boiar.

Vivemos sob a ditadura da performance, onde o sucesso é medido pelo que acumulamos. Aos 30, a pressão por conquistas materiais funciona como um banzeiro inesperado que tenta virar nossa canoa. Como psicóloga que lida com saúde mental de alta complexidade, vejo como essa cobrança gera um sufocamento silencioso. Somos ensinadas que "querer é poder" e, se ainda não chegamos lá, é porque não remamos o suficiente. Essa é a grande falácia que ignora os redemoinhos, os troncos submersos e as falhas de um sistema que nos exige velocidade enquanto o rio está cheio e perigoso.

É aqui que mora um perigo invisível que eu trato todos os dias no consultório: o que a psicologia chama de "desamparo aprendido". Talvez você não conheça o nome, mas certamente já sentiu o efeito. Sabe quando você rema com toda a sua força contra a correnteza, tenta resolver um problema ou alcançar uma meta repetidas vezes, e parece que não sai do lugar? O seu cérebro, exausto de lutar, acaba "aprendendo" que não adianta mais bater os braços. Você solta o remo não porque é fraca, mas porque seus pensamentos concluíram que o esforço é inútil diante da força da água. Aos 30 anos, quando olhamos para as cobranças da vida adulta e nos sentimos em falta, o risco é esse: acreditar que estamos desamparadas e deixar o rio nos levar para onde ele quiser.

Meu "manual para não se afogar" usa a Terapia de Aceitação e Compromisso (ACT) para dizer que o caminho não é a superação heroica, mas a persistência consciente. Aceitar a força do rio não é o mesmo que se entregar ao fundo; é reconhecer o fluxo para saber quando poupar energia e quando agir. Nesta nova década, meu compromisso não é com os recordes de produtividade, mas com os meus valores. Manter a cabeça fora da água, respeitar o meu tempo e não desistir de mim mesma diante das pressões de performance é a maior vitória que eu poderia comemorar hoje. Feliz 30 anos para mim, por cada vez que escolhi continuar boiando e navegando, mesmo quando o rio parecia grande demais para a minha canoa.


Sobre a Autora: Thaline Lima é psicóloga clínica, com registro 10023/20 CRP, especializada em Neuropsicologia, Políticas Públicas e Direitos Sociais. Sua prática clínica utiliza a Terapia de Aceitação e Compromisso (ACT) para ajudar pessoas a navegarem por sofrimentos intensos e dias difíceis, devolvendo-lhes a autonomia e a capacidade de viver uma vida valorosa.

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